Filme do Dia: A Filha de Madame Betina (1973), Jece Valadão
A Filha de Madame Betina (Brasil, 1973). Direção Jece Valadão. Rot. Original Jece
Valadão, a partir do argumento de Marcos Rey. Fotografia Edson Batista. Música
Erlon Chaves. Montagem João Ramiro Mello. Com Jece Valadão, Georgia Quental,
Elza Gomes, Vera Gimenez, Otávio Augusto, Martim Francisco, Arthur Costa Filho,
Paulo Fortes, Henriqueta Brieba.
Otávio (Valadão), após ir ao enterro de Betina
(Gomes), segundo ele a mais conhecida cafetina do Rio de Janeiro, fica sabendo
dela ter lhe legado dois bilhões de cruzeiros. Porém, a herança somente será
permitida caso ele se case com Margot (Quental), filha não reconhecida de um
milionário, que ele e seu grupo de amigos sedentos pelo dinheiro,
acidentalmente acabam por matar, em Londres. Recorrendo a todos os expedientes
na tentativa de encontrar Margot, conseguem até conversar com o espírito da
falecida. Quando Margot fica sabendo que não poderá ter acesso ao dinheiro da
herança sem o cumprimento da cláusula, designa Selma (Gimenez) para fingir ser
ela, mas finda por de fato se casar com Otávio, embora seja envolvida
afetivamente com Bruno (Augusto). Porém, trata-se de um casamento de arranjo
sequer consumado, com Selma se unindo a Otávio, e Bruno permanecendo com
Margot.
A estética dos créditos iniciais remonta a uma arte
muito próxima da praticada na televisão brasileira à época (vide novelas como Corrida
do Ouro), talvez pelos mesmos artistas. Produções como esta se não
existissem deveriam ser inventadas, como é o caso da cena em flashback
que a madre superiora recorda da cafetã Betina, ao som da música sacra. Quando
baixa o espírito de Betina, imagina-se que a dublagem irá representar a
possessão, e é o que de fato ocorre, sendo mais um elemento a se somar ao ethos
pornochanchadesco – um negro robusto falando com voz de mulher, anteriormente
já se havia observado um gay efeminado enlouquecido pela presença dos quatro
amigos. Quando Londres surge no horizonte dos escroques, imediatamente se ouve
um generoso trecho (não creditado, evidentemente), de Help! Recicla ou
dá sequência a um roteiro de outra pornochanchada de três anos antes, O
Enterro da Cafetina, adaptado diretamente de romance de Marcos Rey, e com
parte do mesmo elenco de apoio (Brieba, Gomes, Fortes) e um principal
(Valadão), ambos produzidos pelo mesmo Valadão. Valadão este cujo tipo
cafajeste parece ainda mais ressaltado nos figurinos da época, com calça justa
espalhafatosa, camisa por dentro da calça e cinto saliente à mostra. Há também
fantasias a respeito de um padre no meio do bordel. Quando finalmente se tem
assegurada a fortuna, um sorriso de Valadão é o suficiente para se ter certeza
que o empreendimento envolverá alguma “sacanagem”. Na trilha musical
inventivamente se cabe de tudo, dos referidos Beatles a uma versão de Bach,
passando por um tema clássico contemporâneo (e um tanto kitsch) cantarolado de
bastante sucesso à época, do compositor francês Saint-Preux (Concerto pour
Une Voix). Apesar de uma camada de cinismo considerável, não há como
esconder, em última instância, o conservadorismo da pornochanchada; ao final de
contas o amor de Otávio por Margot o faz até superar seus interesses imediatos
por dinheiro e sexo. Ainda que haja um final com a reconversão das coisas a seu
devidos lugares, e nisso tampouco deixa de se presenciar este conservadorismo.
No campo relativamente tímido de uma exposição de nudez (quase sempre exclusivamente
feminina) se apela até para situações completamente disparatadas em relação ao
enredo, como algumas canções o eram, na sua predecessora chanchada, como é o
caso do episódio da pescaria das calcinhas da vizinha. Ou simplesmente da
observação casual de uma vizinha de um apartamento percorrido pelo grupo em
busca de Margot, despindo-se. |Magnus Filmes para Cinedistri/Embrafilme/UCB.
104 minutos.
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