Filme do Dia: O Anjo Nasceu (1969), Júlio Bressane
O Anjo Nasceu (Brasil, 1969). Direção e
Rot. Adaptado: Júlio Bressane, baseado no conto Comédia da Inocência.
Fotografia: Thiago Veloso. Música: Guilherme Magalhães Vaz. Montagem: Mair
Tavares. Cenografia: Guaracy Rodrigues. Elenco: Hugo Carvana, Milton Gonçalves,
Norma Bengell, Maria Gladys, Carlos Guima, Neville D’Almeida.
Santamaria
(Carvana) e Urtiga (Gonçalves) são dois marginais perigosos que, fugindo da
polícia, invadem uma casa da classe média carioca, matando um homem e
transformando a empregada e a dona de casa (Bengell) em reféns. Santamaria,
que se encontra ferido na perna, acredita na chegada de um anjo e é mais
violento, acreditando que sua violência o redimirá perante o anjo. Urtiga lhe
segue como um cão fiel. Juntos, acabam matando as duas mulheres. Matam a seguir
um homem para roubar um carro e também a mulher que presenciou o assassinato,
após uma sessão de torturas. Santamaria indaga sobre o futuro de Urtiga após
sua morte, mas esse se recusa em acreditar que o amigo irá morrer. Juntos fogem
estrada à fora, com Santamaria urrando de dor.
Realizado após Matou
a Família e Foi ao Cinema, o filme apresenta o mesmo interesse em sua
estilização da violência e numa secundarização da narrativa diante de uma
proposta de poética visual. Nesse sentido, se encontra repleto de flashforwards,
apresentando muitas das cenas de violência que virão posteriormente em seus
primeiros planos e introduz uma seqüência de um casamento que não possui
qualquer motivação diegética. Ainda assim é bem mais conciso que Matou a
Família, centrando-se apenas no drama dos dois marginais. Uma aparente
segunda incursão extra-diegética, com imagens do homem pousando na lua e se
comunicando com o presidente americano, acaba se revelando imagens que os
marginais assistem e comentam debochadamente ao lado de suas reféns. Ao
apresentar a invasão do espaço burguês a partir do ponto de vista dos
marginais, o filme se aproxima de Armadilha do Destino, de Polanski e se
distancia de Horas de Desespero, que apresenta a visão clássica do
terror de uma família de classe média típica americana igualmente reféns em sua
própria casa. Porém, se compartilha com o filme de Polanski de uma certa
simpatia pela anarquia dos marginais, contamina sua própria estrutura com essa
mesma anarquia, enquanto o filme de Polanski segue uma narrativa bem mais
convencional. Existe uma tênue presença de um caráter homo-erótico na relação
dos dois marginais, que se concretiza somente em uma seqüência em que Urtiga
abraça o corpo do companheiro. Ao contrário dos filmes anteriores do cineasta
não há menção velada ou aberta ao momento político de repressão da ditadura
militar. Seu radicalismo, que acabaria
na década seguinte resultando em projetos excessivamente herméticos ou
auto-condescedentes, aqui já se encontra pronunciado na seqüência final, com um
plano fixo de cerca de 8 minutos da estrada onde os bandidos fugiram. Filmado
originalmente em 16 mm, foi copiado para 35 mm, quando de seu lançamento
comercial em 1973. Júlio Bressane Prod. Cinematográficas. 82 minutos.
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