Filme do Dia: Gabriel e a Montanha (2017), Fellipe Barbosa

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Gabriel e a Montanha (Brasil, 2017). Direção: Fellipe Barbosa. Rot. Original: Fellipe Barbosa, Kirill Mikhanovsky & Lucas Paraizo. Fotografia: Pedro Sotero. Música: Arthur B. Gillette. Montagem: Theo Lichtenberger. Dir. de arte: Ana Paula Cardoso. Figurinos: Gabriela Campos. Com: João Pedro Zappa, Caroline Abras, Alex Alembe, John Goodluck, Rashidi Athuman, Luke Mpata, Manuela Picq, Leonard Siampala.
     2009. o carioca Gabriel Buchmann (Zappa) é um jovem de espírito intrépido e aventureiro, que decide realizar uma viagem pela África por um ano que há muito havia sonhado, após ter sido aceito em uma prestigiada universidade norte-americana. Ele parte do Quênia, onde sobe o Kilimanjaro, atravessa alguns países até seu destino final, uma montanha, o Monte Mulanje,  no Malavi. No ínterim, ele encontra com sua namorada brasileira, Cristina (Abras), e várias outras pessoas, a quem geralmente cativa ou, mais dificilmente,  chega a se atritar, como é o caso de um guia a quem havia sido vendido o pacote que dizia dar direito a visão dos gnus.
      Dividido em quatro capítulos, que são os países que Gabriel percorreu, Barbosa realiza uma obra curiosa, a partir da figura real de um amigo pessoal e mesclando atores nos papéis principais com várias das figuras que fizeram parte da trajetória de Gabriel, vivendo a si próprios. Talvez o que o filme traga de mais interessante, além do já apontado,  inclui seguir os passos que o verdadeiro personagem efetivou, numa aventura que é uma idiossincrasia pessoal em relação ao turismo oficial, embora por vezes o abrace (principalmente quando Gabriel se encontra com sua namorada) e traz tanto a dimensão do contato intercultural quanto as paisagens urbanas e naturais de vários dos locais por onde passou. E, igualmente, uma tensão que, voluntariamente ou não, instala-se entre as recordações praticamente elegíacas de todos os que conviveram com ele, inclusive o guia com quem teve atrito e a quem se refere como “inimigo” e a figura demasiado egotista de seu protagonista. Nesse sentido, a figura elogiada em voz over por vários personagens que observamos em cena e de feições e atos generosamente franciscanos vai sendo progressivamente matizada por um canal distinto, que é o de suas próprias ações e obstinada teimosia, que terminará por lhe render a morte. Alguns dos melhores momentos são os que focos de tensão constantemente se estabelecem entre Gabriel e Cris, embora a chave com que os “atores naturais” reencenem a si próprias e as supostas situações que vivenciaram com Gabriel tampouco deixam de gerar interesse, ainda quando (ou talvez por isso mesmo) bastante ralas de uma perspectiva dramática convencional. A pergunta que fica é: até que ponto Gabriel era de fato tão diferente assim dos turistas típicos que visitam o continente africano quanto pretendia ser? E igualmente o quanto de mito retrospectivo vem a ser suscitado por aqueles que com ele conviverem pelo fato de o saberem morto pouco após e do filme ser realizado por um amigo seu que por esse ser alguém tão especial quanto muitos afirmam que ele era. No trato privado com a namorada, observa-se uma intransigência que raia o infantilismo que pode soar pouco atrativo para muitos espectadores, ao que também se soma a sua excessiva metragem – uma boa saída, sacrificando a narrativa fechada, teria sido concluir o filme após a despedida da namorada – mas, no caso do primeiro, trata-se menos de um problema que de uma virtude do filme, ao tentar se aproximar do caráter de seu retratado. Destaque para a bela fotografia de Sotero, mais centrada em seus personagens e o que os cerca que chamando atenção para os movimentos de câmera, em contraste com uma trilha musical nem sempre feliz. Barbosa costuma extrair boas interpretações de atores (e aqui também de não atores, flertando obliquamente com o universo documental). Como uma praxe quase aborrecida, fotos do verdadeiro Gabriel surgem ao final em várias das poses que havíamos observado o ator. Damned Films/Gamarosa Filmes/TV Zero para Pagu Pictures. 131 minutos.

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