Filme do Dia: "O Ouro de Nápoles" (1954), Vittorio De Sica

O Ouro de Nápoles (L’Oro di Napoli, Itália, 1954). Direção: Vittorio De Sica. Rot.Adaptado: Cesare Zavattini, Vittorio de Sica & Giuseppe Marotta, a partir dos contos de Marotta. Fotografia: Carlo Montuori. Música: Alessandro Cicognini. Montagem: Eraldo da Roma. Dir. de arte: Gastone Medin. Cenografia: Ferdinando Russo. Figurinos: Pia Marchesi. Com: Silvana Mangano, Sophia Loren, Totò, Eduardo De Fillipo, Paolo Stoppa, Lianella Carell, Erno Crisa, Giacomo Furia, Vittorio De Sica, Pierino Bilancioni, Gianni Crosio, Agostino Salvietti, Alberto Farnese.
Il Guappo. Saverio (Totò) vive oprimido pela truculência do amigo de juventude, Gennaro (Salvietti), que há dez anos mora em sua casa e dita as regras com sua truculência. Certa noite, Gennaro inesperadamente irrompe choroso, afirmando que um médico lhe afirmou que possuía problemas no coração que poderiam mata-lo a qualquer hora. Saverio percebe que é o momento certo para se livrar desse visitante indesejável, expulsando-o enfaticamente de sua casa e comemorando a noite de natal com a esposa Carolina (Carell) e os filhos. No meio da comemoração, no entanto, Gennaro, que havia sido alertado por outro médico que possuía o coração de ferro, surge subitamente em meio a festa familiar, deixando todos atônitos, antes de novamente sair. Pizza a Credito. Sofia (Loren) é casada com Rosario (Furia) e ambos vendem pizza fiado para os moradores do bairro napolitano em que vivem. Conhecida por sua curvas e sensualidade, chamando a atenção dos homens por onde passa, Rosario tem como amante, Alfredo (Farnese) e em meio às brincadeiras amorosas do casal, acaba perdendo o valioso anel de esmeralda que ganhou do marido quando casaram. A dupla percorre os compradores de pizza das últimas horas, pois o marido acredita que ela pode ter perdido na hora que fazia a massa das mesmas. Numa residência, eles acabam encontrando o recém-viúvo desesperado Don Peppino (Stoppa). Alfredo faz de conta que havia comprado uma pizza de Sofia e lhe devolve o anel na frente de todos. O marido, algo intrigado com o fato de não ter sido computada a compra no caderninho, volta em meio a chuva com a esposa para continuar trabalhando. A Napoli è morto un Bambino. Mãe acompanha o cortejo fúnebre do filho, coordenando tudo que se encontra relacionado a ela e somente desabando em lágrimas quando as oferendas que joga ao chão para as crianças que se encontram próximas acabam. I Giocatori. O Conde Prospero (De Sica) se desespera com a impassibilidade do garoto Gennarino (Bilancioni), com o qual joga e perde gradualmente seu patrimônio. Teresa. Don Nicola (Cresi) casa-se com uma prostitua que sequer conhece, Teresa (Mangano). Intrigada com o fato e com o culto dela a uma garota morta, Teresa virá a saber que seu casamento foi uma espécie de auto-punição, pois seu coração se encontra devotado até a morte à garota, Lucia, que se suicidara por ele. Furiosa com a descoberta, e que dormirão em quartos separados, Teresa abandona a residência no meio da noite mas, após refletir por um momento, acaba retornando. Il Professore. Don Ersilio Miccio (De Felipo), conselheiro de todos os moradores do bairro, acaba recebendo, dentre outras, uma reclamação coletiva dos moradores, com o incômodo causado pelo Conde Alfonso Maria di Sant’Agata dei Fornai (Crosio), que obriga todos a mudarem sua rotina para atravessar a rua com seu carro. Miccio os aconselha a uma imprecação coletiva e sonora feita com a mão e a boca.
Mesmo tendo sido realizado entre dois filmes, Umberto D. (1952) e O Teto (1956), compartilhadores dos preceitos neo-realistas, antes mesmo dele, com filmes como Quando a Mulher Erra e Parque dos Amores, ambos de 1953, o cineasta já havia demonstrado o seu retorno a uma produção de ambições mais modestas e de perfil temático mais próximo ao cinema de entretenimento. O resultado, no entanto, malgrado os que observaram o seu novo rumo na carreira como uma traição ao movimento neo-realista e de declínio artístico, o que acabaria por ocorrer de fato em pouco tempo, é surpreendentemente bem resolvido, ainda que partilhando de irregularidades comuns aos filmes de episódios, uma febre do cinema italiano de então. Adaptando contos do napolitano Marotta para as telas, o filme acabou sendo lançado com uma versão internacional de 107 minutos, sendo que o episódio curto final também somente foi lançado para o público italiano. Chama de imediato atenção a magistral direção de atores, com destaque para Mangano, o próprio De Sica e o garoto com que contracena em I Giocatore. Assim como a incerteza sobre em que terreno se movem os personagens de algumas das adaptações. Quem vai mais longe, nesse sentido, é o episódio da criança morta, que por destoar tanto em termos da verve cômica ao menos irônica dos outros episódios, assim como por ser bem mais monocórdio em sua dimensão narrativa, não por acaso acabou sendo limado da montagem final. Porém, ao mesmo tempo que pode ser observado como um resultado dramático pouco acabado, no sentido tradicional, parece acenar para uma valorização e distensão de um evento, no caso o do cortejo fúnebre, de forma que parece antecipar elementos do cinema moderno. Mais bem conseguido em sua expectativa talvez seja Teresa, onde acabamos por acompanhar pela perspectiva da protagonista, a admirável Mangano, todas as dúvidas sobre onde lhe levará o tal casamento misterioso. O episódio estrelado por Loren surge como o mais rotineiro, banal e afinado com a comédia italiana, já apresentando elementos que seriam maximizados pela comédia erótica da década seguinte, inclusive explorando de forma igualmente afinada com a atriz em início de carreira – sua primeira participação no cinema data de 4 anos antes -  sua sexualidade explosiva. Carlo Ponti Cinematografica/Dino de Laurentiis Cinematografica. 131 minutos.


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